Encontro-me numa paisagem branca

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Encontro-me numa paisagem branca.
Sua frieza repele qualquer sensação
E sinto o vento perfurar minha pele,
Todavia incapaz de alcançar minha alma.
As gotas de chuva respingam em minha testa
Abro os olhos e, indiferente, fecho a janela.
Engulo qualquer vontade, imóvel.
Lá fora, pássaros rodopiam molhados,
Perdidos, harmônicos e necessários.
Vejo-os e os assimilo em mim.
Sinto uma revolução amena
E não desejo estar aqui.

Passeio

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Uma doce revoada de sentimentos
Provoca um furacão de penas de Bem-te-vi,
Anunciando a lenta chegada da Primavera
Dentro de mim, dentro dele.

A sinceridade de nossos sorrisos
Ressoa em cada orvalho da grama adormecida,
Molda cada nuvem de um céu mais azul,
Colore cada pétala das flores à nossa volta.

O vento vem como brisa, trazendo odores
Que nos fazem querer respirar fundo.
Mãos dadas e vontades recíprocas sobre a ponte: o passeio
Ideal ao pôr do sol, alaranjado pelos olhares carinhosos.

A escuridão é o abrigo de todos os loucos

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A escuridão é o abrigo de todos os loucos
Que se desfazem no canto fétido, mofados.
A solidez da culpa e do pecado
Contrastam com a liquidez mundana do espírito.

Além do bem, estão o mal e a realidade
Cujo elo de conexão é a verdade customizada
No pandemônio criado pela dúvida e pelo erro
Está também a hipocrisia de uma sociedade quebrada.

O medo mastiga e engole a decência
À medida em que bebe doses infinitas de ignorância
O ego derradeiro – falso – se acaba no limite da vida
E a liquidez desta se faz gasosa – evapora.

Efusão

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Pó, sujeira, barro e saliva
Levanto minha cabeça e meu pescoço dói
Vejo meu corpo apertado contra o chão

Permaneço estática – e podre.
Com olhos miseráveis, reconheço o ambiente
E só faço sentir uma quinta dimensão.

Transcendo – e a existência mundana
Já não me interessa.
Esta percepção me leva à fluidez

E a luz, certeira e experiente,
Envolve-me por completo.
Não me perco, sinto a efusão.

A dança da louca

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A louca dançava por entre as pedras
Rodando com os pés ensanguentados
Alvo de Neptuno – a maré subia.
Aquela face sem expressão – me recordo
Puxava a escuridão para si
E a Lua se afastava, indiferente.
O suor junto ao sangue, ao sal e à terra,
Fazendo-se opaco pela podridão humana
A boca seca, rachada – marca fundamental
De um rosto desfigurado pela vida.
Roupas esvoaçantes, encardidas por passos tortos
Os braços abertos e a clareza no ar – não no espírito.
Uma aurora, um tombo eterno.

I

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Da série “Poemas abandonados no tempo” rs

Sinto a perspicácia de suas expressões
E a determinação intensa de seus atos.
Vejo uma visão astuta, orgulhosa e exata,
Fundamentada na reta do Equilíbrio.

Esta suave brisa marinha me inquieta.
Com leveza ríspida, traz seus problemas
E preocupações a minha alma – sorrio.
Escolho calmamente minhas palavras.

Sinto um tom misterioso em sua voz,
Retratando qual sua percepção de vida,
Única, direta e sincera – resumo;
Mostra uma criatividade genial.

Descrevo-o, deixo-o progredir com receio;
Por fim, assumo: esqueço minha defesa.
Permito-me a imaginar, e gosto de
Pensar sua armadura ali, também no chão.

07 de Setembro, 2010

Doença

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Sombras e inquietação por toda parte, menos em mim.

À minha volta, uma existência cintilante. E podre. Bêbada. Inútil.

Se sua espada não corta o vento, o que quer comigo, então?

Jogo fora meu orgulho e digo que minhas dúvidas são antigas.

Retomo a firmeza e, para mim, o talvez não existe. Não no longo prazo.

Como consolo, só digo que não há escolha errada que não possa ser mudada.

E quem merece ser consolado?

Tenho ao meu lado algo que não sei descrever.

E só porque espero, não significa que vai durar.

Estado de espírito inexplicável

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Enxergo o carneiro de Augusto dos Anjos.

Penso que Alberto Caeiro deu o mesmo fim do carneiro ao Simbolismo.

No final das contas, vejo a morte como algoz da vida (gosto de personificação). 

E, por falar em pessoas (hum?), sei que elas têm medo do desconhecido.

Então, sinto medo. E o sinto tão forte em mim!

Afinal, quando seu herói demonstra medo, o que você sente?

_ A mesma dor mental causada pela insegurança.

E o que você faz?

            _ Vejo meu copo cheio.

            _ Pois isso parece suficiente – digo.

Encerro. Só que não.

 

Texto para mim

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Universo. Só universo. Uni-verso. U inverso. Une o inverso.

 

E só porque o que eu sinto é infinito e o sinto escorrer por entre minhas mãos, mas nunca de minha vontade. Olho para as palmas de minhas mãos. Estão estáticas e, por um momento, sem vida.

 

Sinestesia Dali, sinestesia daqui. A combinação de notas musicais me leva a lugares que não posso e nem consigo estar, todavia desejo conhecê-los. Então, eu estive lá e as estrelas sorriram para mim. Disseram-me para emprestar alguns pedaços da Lua e construir minha própria ponte para o destino.

 

Mas eu rio do destino. Um riso tão fluido, que se mostra temeroso. Não há nada que não possa ser mudado e o esforço é qualidade fundamental para quem diz ter objetivo. Eu vejo seus objetivos tradicionais e não sei se concordo. Por que deveria me envolver em sua vida? Dou-lhe, não um, mas quantos sorrisos forem suficientes para lhe mostrar meu apoio.

 

E digo: sinta a melodia do universo pairando por sua mente, perambulando em seus pensamentos e debochando de sua insignificância frente à existência. Deixe-se envolver por esta melodia, decifre-a e harmonize-se com ela.

 

Sinta a expansão deste mesmo universo e observe o quanto sua sede de vida cresce! É como se se assemelhasse a uma respiração profunda, mas tão profunda, que sua feição sorriria aliviada. E eu lhe daria um ramo de margaridas coloridas.

 

Encontro-me, então, solitária, mas de fato não o estou: sinto a demência de Dostoiévski, a esquisitice de Kafka, a melancolia de Cronin e a exatidão corajosa de Tolstói! Ninguém escreve ao coronel, mas eu gostaria de fazê-lo.

 

A experiência não é barata, mas a covardia é uma patologia do ser humano. “Isto porque ele conhece a dor”, já diria um filósofo de bar. E nossos pequenos príncipes? Ando duvidando de sua índole. Gostaria de julgá-los, mestre Lobato? Peça permissão à Srta Malfatti, por favor.

 

Sinto as mãos de ferro de Thor de desvencilhando de meu punho e percebo seu machado caído ao chão. Fatos suspiram mudanças de tempo. Basta observar a história para prever o futuro. Não, não basta. Consideraria tal atitude um escárnio para com a capacidade humana. Ah, reles mortais!, se querem o paraíso, entendam-se com Osíris.

 

Construam templos e indústrias. Para isso, movam (retirem) montanhas. Natureza inconveniente essa nossa. Permitindo-me uma digressão, gostaria de citar Prometeu: “saia águia, meu fígado, não!” Afinal, tempos difíceis e loucos o exigem aqui dentro de mim, em seu devido lugar, e o que posso fazer e dar de ombros.

 

Veja bem, leitor: os inversos e diversos convergem em um só fim.